2 Co 12:7- “E, para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte.”
Nem sempre as pessoas conseguem entender questões bíblicas, e muitas vezes erroneamente pegam midrashim (parábolas) e consideram como reais, e interpretam de maneira desastrosa textos bíblicos. Há realmente textos difíceis de se interpretar, e cada pessoa tem o direito de ter sua própria visão, ainda que errada, de textos sagrados.
Nesse verso da Brit Chadashah, há quem considere o “espinho na carne” como algo literal, colocado sob a pele do apóstolo; outros acham que isso é apenas uma analogia, e eu particularmente acho que isso é pouco relevante, diante da lição que aprendemos com o que está relatado.
Primeiro, Shaul fala de “para que não me ensoberbecesse” então não foi um mero acidente de percurso. O tal espinho foi posto nele para que ele não se achasse tão poderoso, em função de sua posição, por ser um homem que revelava grandes interpretações dos textos sagrados, convertia a muitas pessoas através de seu poder de persuasão, enfim... qualquer um que atinge um status corre o risco de se achar, e usar uma carteirada: “você sabe com quem você está falando?”
Esse é um risco grande que incorre sobre todos os que atingem posições de reconhecimento público.
Segundo, você já teve um espinho na carne? Uma farpa que descola de uma vara, e penetra na carne de seu dedo, ou pior, debaixo da unha? Isso incomoda uma barbaridade... se você não tirar, pode infeccionar, ou pode ficar ali quietinho e de repente começa a doer. O tal “espinho de Paulo” era exatamente isso, o esbofeteava.
Bom seria se sempre que começássemos a nos achar melhores que os outros, tivéssemos um alarme interno que nos dissesse: “ei, quem você pensa que é? seja humilde rapaz!”
Pirkei Avot nos diz: “seja humilde, muito humilde, porque seu fim é servir de comida para os vermes”
Shaul HaShaliach pediu três vezes ao Eterno que retirasse dele esse espinho, mas isso não aconteceu. E ouviu como resposta: “A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza.”
São nas derrotas que aprendemos mais, dizem os pensadores modernos. Nas vitórias, nossas falhas são mascaradas pelo sentimento de todo vencedor, mas quando caímos, vemos o quão miseráveis podemos ser.
A questão do espinho é a lição da humildade, do respeito, e de nossa capacidade de superar nossos instintos mais básicos de auto-engrandecimento.
A Torah fala por exemplo que Moisés era o mais manso de todos os homens. (Nm 12:3) Mas a mesma Torah fala que ele matou um egípcio e sua esposa o chamou de homem sanguinário (Êx 4). Como entender, qual dos dois era Moisés?
Simples: de novo recorremos ao Pirkei Avot, que diz: “A quem se deve chamar de forte? Àquele que domina seus próprios instintos.” (Avot 4:1)
A mansidão não era uma característica de Moisés, mas ele soube “dominar” sobre seu instinto e isso é o que fez dele grande, mais do que todos os homens de sua época. Ter o auto-controle.
Pedro, em sua carta disse: “pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que, pela concupiscência, há no mundo, e vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência, acrescentai à vossa fé a virtude, e à virtude, a ciência, e à ciência, a temperança, e à temperança, a paciência, e à paciência, a piedade, e à piedade, o amor fraternal, e ao amor fraternal, a caridade. Porque, se em vós houver e aumentarem estas coisas, não vos deixarão ociosos nem estéreis no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo.” (2 Pe 1:4-8)
Nunca chegaremos a ser perfeitos se nos deixarmos levar por qualquer sentimento de engrandecimento; uma coisa puxa outra, segundo Kefah, e temperança vem depois da ciência, do conhecimento, mas vem antes da paciência e do amor verdadeiro.
Podemos aprender (ter ciência) mas se não tivermos auto-controle sobre nossos instintos (inclusive de prepotência) nunca atingiremos o nível de ahavah necessário.
Como foi dito: “o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza” Se reconhecemos que não somos super-homens, perfeitos, sábios, grandes, o espinho na carne nos ensinará a sermos mais humildes e aí sim, o poder de Deus se aperfeiçoará em nossas vidas.
A propósito, acredito que sim, o espinho era literal, mas carregado de lições espirituais.