“Os filhos de Israel prantearam Moisés por trinta dias, nas campinas de Moabe; então, se cumpriram os dias do pranto no luto por Moisés.” (Js 6:17)
Ontem foi dia 11 de setembro e pouca gente se lembra dessa data, mas para familiares de quase três mil pessoas essa será sempre uma data de memória, por conta da dolorosa morte de seus entes queridos nos atentados terroristas ao World Trade Center, em Nova York (e no Pentágono).
Lembro-me de como se fosse ontem, era de manhã e a primeira notícia que vi foi de que um avião de pequeno porte havia acidentalmente se chocado contra uma das torres gêmeas; depois de alguns minutos, o mundo percebia de que era um atentado contra a vida de milhares de pessoas inocentes. Hoje, esse atentado já cai no esquecimento, muito embora a morte seja sempre algo que choque e não gostamos de falar sobre isso, embora, muitas vezes, seja preciso.
Há quinze dias atrás, eu estava no Rio de Janeiro, com meu pai e o chaver Sion, e era sexta-feira, estávamos empolgados com o final de semana que teriamos ali. Hospedados num hotel simples, fomos dormir cedo, e de repente, meia-noite toca o celular do meu pai. Acordamos assustados, Sion perguntando para mim o que havia ocorrido, enquanto meu pai conversava ao telefone. Uma angústia tomava conta de mim naquela hora; escutava meu pai falando sobre morte, ele também parecia não acreditar. Do outro lado da linha, minha mãe contando do falecimento de um Rosh de nossa kehilah. A partir de então nossa viagem ao Rio tinha perdido completamente a graça, já não fazia sentido mais, mas tinhamos compromissos a cumprir, e seguiram-se várias ligações e nossa madrugada de pesadelo parecia não ter fim.
Mas um Rosh tem que ser forte, tem que ter a cabeça fria, tomar atitudes com serenidade. Por providência divina, o Rosh Ezrah estava em Curitiba, e tudo foi encaminhado para ele ir atender ao funeral. (falo disso depois)
Amanheceu no Rio, alguém tinha que transmitir o estudo da parashah, e lá estava meu pai, e em alguns momentos a voz embargava, lágrimas ao lembrar do amigo que subitamente nos deixara horas antes. Fiz uma palestra de tarde, meu pai fez outra na sequência, e de vez em quando a imagem do Yohanan vinha à mente. É evidente que todos da CINA ficaram tristes, mas quem conviveu (como nós) com ele em diversas situações, certamente sentia uma dor grande.
No dia seguinte, café da manhã, ainda abalados, falávamos sobre o assunto e então troquei algumas mensagens com o Rosh Ezrah, o elogiando por sua atitude, por tudo que ele fez pelo Yohanan no dia anterior, ao cuidar, dar banho, vestir o kitel, prepará-lo dignamente para o sepultamento. Na hora sei que nada conforta o coração da esposa e filha, mas sei também que é preciso uma serenidade grande para um homem preparar um sepultamento de um amigo. O Rosh Ezrah foi o nosso Chevrah Kadishah nesse dia. De alguma forma, fiquei feliz pelo fato do Rosh Yohanan ter sido honrado em sua morte.
Voltamos a Curitiba, e eu tinha certeza de que a familia estava sendo amparada pelos roshim e amigos próximos durante o período de “shivah” naquela primeira semana.
No primeiro shabat em Curitiba depois de tudo, enquanto rezávamos o shacharit, algumas vezes chorei, lembrando-me das risadas do Yohanan, as vezes era como ouvir a voz dele, lembrava-me do shabat e dos dias juntos em Israel, onde fizemos várias fotos juntos, eu, ele e o Rosh Kefah, de Campinas. Mas era preciso engolir o choro e “trabalhar” na tradução das prédicas para os americanos, e foi justamente o Sion, quem veio falar comigo no intervalo e me consolar.
Agora, duas semanas, ainda ouço as risadas, as palavras de alguém que parecia estar sempre de bom humor; o Yohanan foi o primeiro a surgir com os dvds do Mordechai Ben David, com documentarios que ele baixava do youtube, e sempre vinha com boas palavras. Nesses dias, algumas vezes tenho ouvido uma canção da Neshama Carlebach, chamada “Al Aileh Ani Bochea” (Ocean of Tears) um oceano de lágrimas... e sempre me recordo dele.
Tudo isso pode não parecer fazer muito sentido, mas é a dor pela perda de um amigo. Não sei como será nos próximos congressos, foruns, e eventos da CINA, sem a presença desse sempre homem de bem em nosso meio; apenas sinto, que já não teremos mais sua luz a brilhar entre nós.
Para os amigos de Imbituba, o shabat deixará de ser um dia de alegria, pelo menos durante o periodo de “avelut” durante o primeiro ano. Será como os filhos de Israel, que perderam Moisés e o prantearam por trinta dias. Para a esposa Marylena e a filha, certamente é uma memória que nunca se apagará, de um bom esposo e pai, amado por todos.
Não gosto de períodos de luto, não sei o que falar aos familiares, mas sei que compartilho de sua dor, e sei que em breve eu e minha esposa estaremos em Imbituba, levando nossa solidariedade e respeito. Quando os bons morrem, o mundo perde um pouco de sua beleza.
Que guardemos na memória e fiquemos todos com a lembrança do brilho de um homem tsadik que ajudou a tornar esse mundo um pouco melhor.
*** Mais uma vez, agradeço e reconheço ao Rosh Ezrah por tudo o que ele fez pelo amigo Yohanan. De alguma forma, isso trouxe conforto a todos que amavam ao nosso querido Rosh de Imbituba.
“Preciosa é aos olhos do SENHOR a morte dos seus santos.”(Sl 116:15)
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