Mc 14:7 “Porque os pobres, sempre os tendes convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem...”
Numa das preces do shacharit diário dizemos: “Soberano dos mundo e Senhor dos Senhores! Não é confiando em nossos atos de Justiça que apresentamos a Ti as nossas súplicas, e sim na Tua infinita misericórdia. Que somos nós? Que é a nossa vida? Que é a nossa benignidade? Que é a nossa justiça?...”
De vez em quando fico observando pessoas bancando o tsadik, se achando “o justo” e talvez o sejam realmente e nós é que não somos capazes de entender o senso de justiça divino. Daí sempre começo a meditar sobre essas coisas. Dias atrás, estava no mercado com a esposa, e ao sairmos, começamos a falar sobre o valor do salário mínimo (hoje, pouco mais de R$ 700) e o quanto é injusto.
O governo brasileiro alardeia, ainda mais agora, em época de eleição, que tirou milhões da linha da miséria, que as pessoas mudaram seu status social. Será mesmo?
No Brasil, e em geral no mundo, a sociedade se divide em classes, classe A (os muito ricos) B (ricos) C (classe média) D (média baixa) E (pobres) e os miseráveis. Em que classe estamos? Como se define isso? Quem é pobre?
Quanto mais dinheiro se ganha, mais se perde também o senso de valor, de quem é pobre...
Por exemplo: você olha um cidadão com um carro de mais de cem mil reais e fala: “Tá rico hein?” e o que ele te diz? “Rico nada, rico é fulano que tem tal carro, que custa trezentos mil... e já o que tem um carro de trezentos mil diz: “rico é o que tem uma ferrari..” No sentido de pobreza também ocorre o mesmo. Então me vejo questionando essas coisas, para tentar ser justo.
Em nossa comunidade adotamos o terceiro dízimo, como forma de ajudar os pobres, mas de novo, como sabemos qual a hora de ajudar alguém pobre? Para alguns, é quando a pessoa está desempregada, com três contas de luz vencidas, sem comida na mesa, etc... mas seria isso justo?
Quando adotamos o terceiro dízimo (e cada rosh tem uma visão acerca do assunto) nas congregações que dirigi tinha um princípio. Eu não queria que tivéssemos milhares de reais numa conta, sem beneficiar a ninguém. Era lícito termos um valor “X” para uma emergência, mas sempre que passava disso, eu procurava ver as pessoas que tinham menos recursos e lhes oferecia uma ajuda. Vou citar alguns exemplos que vivemos:
• Há muitos anos atrás eu e minha esposa fomos visitar uma família da congregação, que ninguém consideraria “pobre merecedor do terceiro dizimo”. Pra agradar à criança, levei uma caixa de bombons. A visita foi boa, e enfim, cumprimos o objetivo de visita “pastoral”. Dias depois, a mãe veio me procurar e agradeceu, dizendo que os filhos (além da menininha, já tinham dois filhos adolescentes) nunca haviam ganho uma caixa de chocolates, pois eles, apesar de nunca terem passado fome, também nunca tiveram dinheiro pra “futilidades”.
Me senti mal, porque em casa também nunca faltou, mas de vez em quando, a gente tinha chocolates, sorvetes, enfim, coisas que agradam toda criança.
Hoje, de vez em quando vou com meus filhos ao cinema, na saída pegamos um sorvete casquinha, enfim, nada de esbanjar, mas uma diversão familiar; raramente jantamos no shopping também. Mas você sabia que tem crianças que nunca passaram fome, mas nunca tiveram uma chance de ir num cinema? Nunca ganharam uma bola de couro, nunca foram num shopping e “esbanjaram dinheiro” numa sorveteria?
Toda vez que fazemos isso, eu volto pra casa feliz com meus filhos e agradecemos ao Eterno por essa bênção. Somos ricos? Talvez diante de algumas pessoas sim, pois temos um carro razoável, tv a cabo, internet...
• Meu filho do meio, Ariel, ama carrinhos. Ele sempre ganha um ou outro Hot Whells. A coleção dele tem cerca de 120 hoje, mas era pra ter certamente mais de duzentos. E de vez em quando o questionamos; mas nunca passa disso sua coleção, cadê os carrinhos que comprei? Ele responde, na sinceridade infantil: “dei alguns pros meus amigos ué?”
Dias atrás, voltei de Israel e trouxe um fone de ouvido pra ele; achei que ele ficaria feliz. Ficou! Daí ele falou pra mãe dele: “posso dar esse fone de presente pro fulano (um menino da Beit Sede)?” Então embrulharam num pacote de presente e no shabat seguinte ele entregou ao amigo.
• Quando alguém necessitava de ajuda na congregação, para pagar as contas atrasadas, eu sempre falei ao tesoureiro para darmos um pouco mais, e dizia ao chefe da familia: “isso pra pagar as contas e tome mais tanto e compre um chocolate, leve seus filhos no shopping, no parque, pague um doce pra eles...”
Terceiro dizimo também é pra essas coisas (na minha modesta visão) e como Yeshua disse: “sempre tendes os pobres convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem..”
• Um dia eu estava na congregação, batendo papo com uns amigos, e de repente veio um membro e chamou outro em particular. Fiquei curioso, mas não questionei... na semana seguinte, aquele homem que fora chamado em particular me contou, feliz da vida: “fulano me chamou porque ele queria dar a mim e minha família a oportunidade de irmos no congresso, e ele iria pagar tudo, passagens, estadia...(essa familia tinha 4 pessoas, e o gasto seria certamente mais de R$ 1000,00)”. Se você olhar para o chaver que fez essa tsedakah, não acredita que ele tenha tudo isso, que possa pagar diárias do congresso para uma família inteira apenas por tsedakah... mas ele fez. E essa família, que nunca tinha tido tal oportunidade, viajou feliz para o congresso em Sumaré.
Tenho pra mim que pobre (financeiramente) é todo aquele que possui menos que eu. Então, meu terceiro dizimo também é pra estes, para ajudá-los a quem sabe ter um pouco mais, a viver um pouco melhor...
De que adianta ter trinta, quarenta mil no banco, como terceiro dizimo, se não compartilharmos com aqueles menos abastados entre nosso povo... podeis fazer-lhes bem...
Se você, como eu, não é rico, mas sente que tem relativo conforto, desfrute disso, é uma dádiva divina, mas olhe pro irmão que está do seu lado.
Ofereça a ele uma oportunidade de desfrutar de algo bom. Dê brinquedos não apenas a seus filhos, mas aos filhos dos outros... ofereça uma caixa de bombons, um carrinho novo, uma boneca... porque tsedakah não é feita só de cesta básica.... porque sim, podemos fazer-lhes o bem.
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