Há alguns dias saí de casa em Curitiba, e vim para o Mato Grosso, cumprir mais uma viagem a serviço da Congregação. Nunca reclamo, pelo contrário, amo o que faço. Depois de alguns dias longe de casa sempre bate uma tristeza, saudade de minha esposa Eliana, com quem estou casado já há 15 anos, 2 meses e 5 dias. Meus filhos são meu maior tesouro, Abel e Ariel, jóias raras, herança do Eterno, meu galardão.
Depois de um shabat agradável com os irmãos daqui, agora, ao escrever estas palavras já são duas e quarenta da madrugada, sem sono, acabei de assistir em meu computador um filme sobre o amor de um casal. Chorei um pouco e resolvo escrever pra ver se passa a insônia.
Estou hospedado, como a primeira visita a se hospedar na casa de um casal de amigos. O Guedy, cara simples, inteligente, capaz, um amigo mesmo, junto com sua esposinha Raquel, menina doce, que saiu de um lugar frio como Caxias do Sul e aceitou o desafio de ser uma esposa neste lugar que o calor é intenso, o pó é constante e o ar condicionado tem que estar sempre ligado. Sair na rua, o calor já nos faz desanimar.
Bom, cheguei, fui muito bem recebido, como se fosse alguém importante, fiquei e fui conhecer um pouco a vida desses irmãos que vemos somente no congresso. E digo uma coisa: não há nada como conhecer as pessoas mais de perto, ouvir suas histórias.
Aqui do ladinho da casa do Guedy e da Raquel está a oficina de bicicletas MG. É ela a fonte de sustento do zaken Milton, há décadas. Das bicicletas (centenas, milhares aqui em Cáceres) e nas bicicletas conto a história que vi e ouvi. A bicicletaria MG é minha fonte de inspiração hoje.
Desde que cheguei fiquei curioso em saber o motivo do nome: MG. Seria uma errônea homenagem ao estado de Mato Grosso (MT), já que MG é Minas Gerais? Não, não era. MG é sinônimo de amor. Da história de amor, amor verdadeiro.
Perguntei ao Zaken Milton, o motivo do MG e ele pacientemente me explica:
“Isso aí é o seguinte Rosh, eu vou lhe contar... a letra M é de duas pessoas, Milton e Marli e o G de quatro presentes Gimerson, Gideão, Geisa e Guedy. Então ficou MG. As pessoas acabam confundindo, mas é isso.”
Aí eu, Felipe Moshe, senti vontade de dar um abraço naquele homenzinho magrinho, de 53kg, 58 anos, que me ensinou algo sobre o amor. A oficina deveria se chamar M2G4, numa homenagem aos seis. Mas que importa se os outros não sabem o que significa o MG... o valor tá dentro daquele coraçãozinho de homem dele.
Hoje, durante o shabat, eu fiz a transmissão das funções do Rosh, do Milton, para seu filho Guedy, um rapaz já bem alto, forte, bonito, com sua esposa também igualmente bela. Enquanto falava, pensava em quantas pessoas teriam a honra que esse pai tem... passar o cargo ao filho dedicado às coisas do Eterno. Aí, em certo momento, eu disse que o Guedy não iria assumir a congregação assim, de uma vez, mas que ele deveria sempre se aconselhar com o pai, e enquanto o menino chorava, talvez pensando na sua enorme responsabilidade, o pai orgulhoso me disse: “na verdade Rosh, sou eu quem me aconselho com esse menino. Ele é que tem sido o professor.”
Muitas, muitas coisas passaram pela minha cabeça na tarde desse shabat. Como a Geisa, um dos quatro presentes do seu Milton e da dona Marli, lá agora, distante vivendo no Rio Grande do Sul, com seu esposo. Rio Grande, de onde meu amigo Guedy foi buscar sua Eshet Chayil. Geisa, mal nos conhecemos, mas nossas orações estão contigo neste momento dificil. Lembrei-me que há dois meses atrás eu estava lá em Caxias, no casamento do agora Rosh Guedy, vendo ele chorar ao ler a Ketubah, quando mencionava o doce nome da mãe, Marli, de abençoadissima memória. Pensei no meu amigo Rosh Elazar, que viu sua irmã caçula sair do RS e entrar nessa bendita família. É bem verdade, ela ainda vai sofrer com o calor, mas o que é o calor quando se tem o amor?
Sei que essa semana valeu a pena ficar longe de minha esposa e filhos, embora teria sido maravilhoso que ela estivesse aqui comigo. Mas sei que aprendi que posso ser um marido melhor, que quem sabe o Eterno me permita ser para a Eliana, o marido que o Milton foi para a Marli.
No quarto ao lado, o casal de amigos dorme um sono tranquilo enquanto medito nesse exemplo de amor que aprendi com a família daqui de Cáceres/MT. Exemplo que oro, possa continuar agora com o Guedy e a Raquel.
Agora, pouco depois das três da madrugada de domingo, minha prece é que Deus me permita de ser um Milton. Um homem em quem se cumpriu as palavras do Salmo 128: “Bem-aventurado aquele que teme ao SENHOR e anda nos seus caminhos! Do trabalho de tuas mãos comerás, feliz serás, e tudo te irá bem. Tua esposa, no interior de tua casa, será como a videira frutífera; teus filhos, como rebentos da oliveira, à roda da tua mesa. Eis como será abençoado o homem que teme ao SENHOR! O SENHOR te abençoe desde Sião, para que vejas a prosperidade de Jerusalém durante os dias de tua vida, vejas os filhos de teus filhos. Paz sobre Israel!”
Obrigado zaken Miltinho, homem franzino, mas um exemplo de caráter, de humildade, de mansidão e de amor! Sua lição é algo que não se aprende em livros, apenas é possivel aprender conhecendo a história de amor da MG bicicletaria.